sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

ALERGIA

Rubem Leite

Crontinho pensado na tarde do dia 28 de dezembro de 2010

e escrito na manhã de 30 de dezembro de 2010.


Eu nasci no hospital. Meus dois irmãos antes de mim, também. Mas os mais velhos nasceram em casa. Quando voltávamos para casa após meu nascimento colocaram em mim uma roupinha azul. Já que dizem que azul é cor de homem. Superstição, apenas. Mamãe me disse que durante todo o percurso eu gritava desesperadamente e chorava sem parar. Eu estava vermelho e todo empolado. Assim que chegamos em casa minha irmã tirou a roupinha e me deu um banhinho para refrescar, limpar. Desinfetar. Assim que fiquei livre da roupa parei de chorar, com o banho tomado já não estava mais vermelho e após colocar um pagãozinho branco até o empolado foi embora. Descobriram que sou alérgico ao azul. E quando viram que eu tava todo sorriso olhando para o escudo do Clube Atlético Mineiro descobriram que eu gosto apenas do preto e branco. Viva o Gaalooo! Viivaaa! Urru! É CAMpeão. É CAMpeão.

Ofereço como presente de aniversário às irmãs

Ana Paula Pereira Amorim e Lorena Pereira Amorim,

que apesar de cruzeirenses são gente boa.

Peço que não vejam no oferecimento do cronto uma ofensa ou algo assim,

mas apenas um chiste.

Ofereço também à MEIAcia dança-multimídia e à Casa Laboratório

importantes entidades artísticos-culturais de Ipatinga MG.

Por fim ofereço a todos os Atleticanos e aos “devotos do ‘atleticanismo’” como voto de

um 2011 maravilhoso em todos e quaisquer os sentidos.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Thiago

Obrigado por tornar-se meu seguidor.
Gostaria de contatá-lo, mas não consegui então deixo mensagem aqui.
Para nós, artistas, pessoas que nos acompanham é tudo de bão.

Poética


Poética da Episteme-Arte + Noite de Autógrafos +

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

TOM

Caros colegas,
estou solicitando e intimando o apoio de todos os artistas e agentes culturais de Ipatinga e região, para que juntos possamos mobilizarmos em parceiria com a ASPEM-TOM(ASSOCIAÇÃO DOS PAIS E AMIGOS DA ESCOLA MUNICIPAL DE MUSICA TOM ), para termos forças e reabrir as Escolas de Música e de Artes cênicas.
Por isto estou intimando a todos, para uma reúnião neste dia 27/12/2010 ( segunda-feira ), as 9:00 hs, na Escola de Música - Tom. Local: Av: 28 de abril, centro, ipatinga-mg; para estudarmos uma estratégia em conjunto.
OBS: Esta em anexo o cabeçario do abaixo-assinado.
Desde já, fico muito grato pelo apoio de todos.
Um Abraço!
Ass: Elias Ferreira

sábado, 25 de dezembro de 2010

CASA DA NENA

Escrito na noite de 24-12-10

O Espírito de Deus
Pairava sobre as águas
O poeta que o traduziu
Chocou-se
Que Espírito chocasse sobre as águas
(Como é dito no original).

Eu degusto nectarina
Ouvindo Orides Fontela
Mostrar seus interesses
Nos seus versos
Mostrar sua feição
Nos seus gatos.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

OFICIOS

Durante três meses, nós do projeto OFICIOS, mapeamos a nossa cidade com o intuito de recolher, registrar, documentar e revelar de uma forma sensível parte dos ofícios que ajudaram e que ainda ajudam a construir a nossa estória.


E com o intuito de tornar o trabalho público, convidamos você para um encontro, onde falaremos desse projeto e exibiremos um curta metragem desse processo.


21 de dezembro de 2010 (terça-feira) às 19:00hs
Estação Memória - Rua Belo Horizonte, s/n - Ipatinga, MG

Esperamos todos lá!

--

Leila Cunha
Produtora Cultural e Historiadora
(31) 8829-9591 / (31) 8635-1426
leila.cultura@gmail.com

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Cledir Salvaterra

Cledir,

muito obrigado por ter gostado do que escrevo e que bom saber que Nanda Salles "me apresentou" a você.

Gostaria de saber mais sobre o livro que estará lançando. Fale-me dele, inclusive para poder indicá-lo aqui no aRTISTA e aRTEIRO.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

ASSEMBLÉIA DE ELEIÇÃO DA NOVA CMIC

Dia 20 de dezembro, às 18hs:30min, na Escola de Música TOM (Av. 28 de Abril, 715 – Centro de Ipatinga).
As atividades terão início às 18 horas, com credenciamento e cadastramento dos votantes até às 18hs:30min.
Atenciosamente,
Leibiane Teixeira

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

“A OPORTUNIDADE ESTÁ DENTRO DAS MUDANÇAS”*

Escrita em dezembro de 2010.

Entre o meio da manhã do dia 11 de dezembro e o início da manhã do dia 13.


* Ensinamento de Masaharu Taniguchi.


Ofereço com presente de aniversário aos meus queridos

Gerci Santos, Mayron Engel e Alison Weler.

E à minha mais nova seguidora: Lúcia Ramos.


O primeiro era um rapaz estranho. Se é que era um rapaz. Bastante gordo, bastante branco. Cabelos loiros descoloridos. Tatuagem estranha, quadriculada, azul, vermelha e amarela no braço direito. Bermuda dins e camisa azul brilhante. Mochila carregada de chaveiros de bichinhos, cubos, garrafas de refrigerante e muitos outros badulaques. Todo mundo viu, reparou mesmo. Ele veio e se foi. Sem falar com ninguém, sem ouvir ninguém, sem prestar atenção em ninguém.

A segunda era uma negra bonita. Calça comprida verde florida. Blusa laranja florida. Carnuda. Curvilínea. Alta. Não que eu tenha reparado. Rarrá. Mas que ela era bonita e gostosa, era. Ou parecia.

O terceiro era um homem feio. Dentes feios. Gordo, baixinho, branco e feio. E estrangeiro. Viu-me olhando para a negra.

- Son todas unas ordinarias.

- Quê?

- Las negras son todas unas putanas, perras.

- Como?

- Tuercas todas las negras. Y sucio y asqueroso son todos los negros.

-

- Raza maldita. Todos los negros son repugnantes. Solamente piensan en dinero. Vagabundos, inútiles, inmundos. La desgracia de la humanidad. Todos los negros tienen que morir. ¿No es así? ¿De acuerdo?

- Não! Não concordo e não é verdade. “La soberana del Brasil es una negra”. Nossa Senhora Aparecida.

Saio e o quarto era uma “vóche pachitóza” num botequim

- Quando se bebe cachaça não pode tomar água porque, as duas juntas, água dá cirrose.

Tudo isso numa só manhã. Tudo me fazendo pensar. Mas o que mais me fez pensar foi, é, o nascer do sol. Primeiro, um rasgo de nuvem dourado, depois uma nuvem amarela com o dourado, depois várias nuvens douradas, amarelas e laranjas. E logo, nuvens douradas, amarela, laranjas e uma nesga rubra que cresce bola vermelha que se adoura. É o que mais me move.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

GRITOS DO SILÊNCIO

Ofereço como presente de aniversário ao
artista de circo e ator Luis Yuner.

Ainda não são oito horas e pelo Parque Ipanema vou para o trabalho junto com homens e mulheres, quase todos de maior idade, fazendo sua caminhada matinal. Abraço minha mochila pesada, sua alça se foi. Pensando no Diretor Municipal de Cultura. Parece-me um vampiro. Talvez à semelhança dessas estórias de terror que suga a energia vital das pessoas. Talvez à semelhança dos morcegos que lambem sua vítima anestesiando para depois sugar seu sangue. Ontem ele sem dizer meu nome disse que sou ignorante ou possuidor de intenções escusas por não saber ou fingir que não sabe que subserviência não é o único significado da palavra servir que ele usou na pérola “O Conselho de Cultura existe para servir ao Pode Público”. Pensei até em discutir, mas desistir para não fugir ainda mais do assunto em pauta que era eleição da comissão que analisará projetos enviados para Lei Municipal de Incentivo à Cultura. E se alguém crê que me calei por cobardia fique à vontade para pensar o que quiser, mas acho que o presente texto e o cronto na minha coluna CRONISTA DE 5ª na Nota Independente afirmam o contrário. “AAAAAAAAAAAIIIIIIIIÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊ” de repente grito. É o ataque de um pássaro. Foi um susto, pois a bicada no topo de minha cabeça não passou de um toque. É um galo do campo. Bicho bravo que já vi matar um pardal que se aproximou de seu ninho. E ele ataca sempre na cabeça.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

EM TRÂNSITO

Escrito entre 20 a 23 de novembro de 2010.

Ofereço como presente de aniversário a

Nanda Sales, Coyote Wanderley Barros, Edilaine Peres.


JÚLIO

Eu sou Júlio. Estou no ponto de ônibus quando penso na frase “aquilo não era vida, não era gente, mas algo que existia apenas ‘por formalidade’.”, de Anton Tchekhov, no conto Em Serviço.

Sábado pela manhã a funcionária da ótica na rua Ouro Preto lava a calçada. Chinelinhos, calça preta até o joelho, camisa vermelha com laço na cintura e o nome da loja, branca e cabelos castanhos escuros, rabo cotó de cavalo. Ensaboa, esfrega e chega a colega, negra, mesmo uniforme, com balde d’água que despeja enxaguando. A rua vai aumentando seu fluxo. Carros, ônibus, motos, bicicletas, pedestres. Outra loja abre e a ótica continua limpeza.

- Só mais um balde, tá.

O tá é uma pergunta, uma afirmação ou uma interjeição? E isso importa? Ela continua a limpeza para abrir a loja, sorrir para os que chegam e se vão. E o fluxo na rua aumenta. Outro ponto se abre. Escuto sua porta rolante subir. O balde chega para finalizar a limpeza. Um cara passa falando no celular

- Como posso entrar se o portão tá fechado? ... Ah Tá! ... – Ri. – Menino, nem te conto. Falou isso para mim ... É!...

Desaparece. E a maioria das lojas continua fechada. O fluxo se estagna. Uma mulher alisa o cabelo andando. Calça dins preta e blusa verde abacate. Da Diamantina, no cruzamento, uma loura magrela num vestido roxo com listas verticais pretas alisa os cabelos e some. O fluxo diminui. O dia nublado está super quente. Outra funcionária – sabe-se pelo uniforme – de alguma loja caminha apressada a sua cara fechada. E as pessoas transitam. Uma senhora atravessa a rua, olha para mim e sorri.

Penso em Irene.


IRENE

Irene está feliz. Terceiro mês e seu sonho se realizando. O primeiro de sua meia dúzia de filhos. Ou mais. Júlio, seu marido, a beija sorrindo. Então ela divaga: Depois de uma viagem se conheceram quando voltavam, marcaram um encontro, dormiram juntos e agora, futuros pais.

Ele quis entrar na vida dela como entrou em seu apartamento. Irene é vizinha de um desempregado chamado Pedro, de uma atriz chamada Laura e de um escritor chamado João. Os três têm Histórias em Preto e Branco. Assim como Irene, como Júlio, como eu, como você, como. Mas eles nem nós não fazemos parte dessa estória...

Então Irene estava feliz.

Agora, 5º mês. Seu sonho se desfez com seu filho que se foi, com seu útero que se foi, com Júlio que se foi quando o bebê e o útero partiram.

Lágrimas.


JÚLIO

O fluxo aumenta. Uma garota arrasta uma bicicleta. Um garoto vai à escola. Ao sábado? Greve só serve para isso. Outra loja se abre e outra. Mais uma. Gente séria. Trabalhadores. Donas de casa, donos da vida, vidas sem donas. Caras fechadas. Rostos sem expressão. Pessoas caminham comendo. Moça de salto alto anda como modelo de passarela que quebrou um salto. Um sorriso passa por mim. Motos, carros, pedestres. Meu ônibus. Saudade da Irene. Entro no ônibus.

Júlio segue e espero que tenha gostado de viajar conosco.

sábado, 13 de novembro de 2010

MANHÃ

Os cachos de acácia após madrugada de chuva se sentem acompanhados pelos frutos do pé de jaca. Unidos, os bambuís acompanham as árvores enquanto sabiás, melros, bem-te-vis e outros entoam cânticos. E o morto segue impassível, soberano, como se não desse conta ou não se importasse com seu velório.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

ANDANDO NA CHUVA

Ofereço como presente de aniversário à

Isac Silva.


Eu, com minha sombrinha vi que

Um pião da usiminas ia para casa de bicicleta com cara de pinto na chuva.

As prostitutas no botequim olhavam tristes para a chuva.

O vendedor da banca de jornais abria desanimado na chuva.

Os idosos na fila do Banco do Brasil esperavam minguado na chuva.

O cachorro gania triste coçando a sarna debaixo da marquise na chuva.

Eu entrei no ônibus.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

POSSO

Sentado no banco diante do lago no Parque Ipanema leio “Os Mujiques”, de Anton Tchekhov. “Tu tu tu tuuuuuuuuuuuuuuuu. Iiiiiiiiiiiiiiiiiiio. Priiiiiiiiiiiiiiiiiuuuii”. Esses e outros pássaros. No píer Tai Chi Chuan. À minha direita no gramado pombos arrulham e namoram. O lago ondeia e patinhos saem para a margem esperando comida de mim, que nada levei. “Pode não, moça” grita longe a vigia para alguém que colhia erva para fazer chá. “Ainda são sete horas da manhã”, chuto. Uma avó conta estória para crianças que a temem e se encantam com o que ela diz. Tudo isso acontecendo e eu precisando de R$50,00 para me inscrever no Curso a Distância.
Sobre o curso veja
Torça por mim.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

PROCESSOS CRIATIVOS

Rubem Leite – 18 a 20 de outubro de 2010

Em algumas de minhas mexidas estou ouvindo diversas músicas em saxofone e bebendo vinho seco merlot (até parece que sou algum entendido e não um mero apreciador. Uarrarrá!).

Ofereço como homenagem aos poetas e como presente de aniversário à percussionista Lucimara Nunes.

Aconteceu a Oficina “Processos Criativos – estudos e criações de cena”, ministrada por Rita Clemente, de BH-MG. E “desaconteceu” o espetáculo “Histórias de Chocar – ensaios de amor”, pois deu pane na aparelhagem do Teatro Zélia Olguim, recém inaugurado.

Ambos entre 13 a 17 de outubro de 2010.


Está difícil levantar. Acordo às 04:15h, mas com o horário de verão está duro sair no que, na verdade, são 03:15 horas. Uma hora depois – Cinco no relógio, quatro na verdade – saio com Haicai, Decidido e Vitório. Enquanto abro o portão uma viatura faz sua ronda. Os cachorros saem desembestados. Sigo para minha direita e na Ituiutaba vou também para a direita. Ao virar percebo à esquerda dois rapazes.

- Q c qué?

Um me pergunta agressivo, finjo não ouvir e mostrando não ser nenhum perigo me agacho e chamo “til, til, til, til, til, til”. Vitório e Decidido, que estavam perto deles, vêm até mim. Haicai, que ainda estava na Uberaba, minha rua, também vem sorrindo. Uberaba é uma rua feia. Mas é nela que tenho minha casa minúscula e com quatro pessoas mais três cachorros, mas própria. Estou contente.

Não entrei ainda na rua João Napoleão da Cruz, que fica atrás (ou na frente... de qualquer maneira é paralela) da Uberaba, e a viatura passa outra vez. Dá para vê-la passar pelos garotos que notoriamente fumam craque então ela pára, continua enquanto eu passeio. Quando retorno minutos depois vejo os rapazes no fim da rua e a viatura passa outra vez, não sei para quê, se não faz nada. Entro em casa. Passa o dia e a noite vou para a oficina que falei acima. Entre outras coisas Rita fala “A arte está muito ligada ao conceito que o artista tem dela”.

O vinho acabou, mas não porei mais no cálice. Entretanto o saxofone continua. Será que você está pensando “Mas já?”. Bem! Escrever toma tempo e coordenar idéias, mais tempo ainda. Por isso “Não tem mais vinho”.

Amanheço com dificuldade, passeio com os cachorros, oro, saio, vivo o dia e na Câmara dos Vereadores me encontro com Luiz Ribeiro, artista da dança muito jovem. A gente cumprimenta e se despede. Depois se esbarra de novo, conversa e se despede. E uma terceira vez no dia nos topamos, conversamos, levo-o para casa para falarmos sobre a Lei Municipal de Incentivo à Cultura e nos despedimos marcando para 6ªfeira o início do Projeto que ele quer propor. Vou para Oficina e Rita diz “Não se faz teatro porque se tem um grande ator. Antes do ator há o espaço (o metafórico e o físico)”.

Volto para casa, durmo e acordo com um pouco menos de dificuldade. Estudo um livro que me inspira uma estória. O livro é “Para Realizar o Amor e a Oração”, do Prof. Seicho Taniguchi. Muito bom!

Era uma vez uma caneta, dessas comuns. Sua tinta preta copiava Palavras da Verdade ou ajudava a destacar os profundos Ensinamentos até que uma bela manhã a mão que a movia se irritou com muitas coisas, inclusive com dificuldade da caneta em trabalhar aquele dia, a quebrou no meio e depois se arrependeu. Pedindo perdão a colou com fita adesiva. A caneta machucada na alma ficou mais difícil de trabalhar com aquela mão. Sabe! Uma vez uma boca disse para a mão que o problema do mundo é que inventaram a palavra “desculpa”. Não é uma verdade absoluta, mas tem seu significado... Uma bela tarde outra mão movimentou a caneta e ela registrou palavras culturais. Então a primeira mão deixou-a ir com a nova mão. Sentiu um apertinho dentro de si, mas deixou-a seguir seu caminho. Uma bela noite recebeu um bilhete carinhoso da caneta, entendeu então que estava perdoado e que a harmonia conduz cada um a quem lhe é mais adequado, mais parecido, afastando os opostos e unindo os semelhantes. E foram felizes para sempre sabendo que o para sempre nem sempre acaba.

Na garoinha saio com os cachorros e penso nas palavras de Rita “No teatro, tudo precisa ‘ser’ significado”, penso no acidente com o ônibus da APAE. Nas bandeiras a meio mastro da Polícia Militar e da Prefeitura Municipal de Ipatinga. Nena de Castro, minha amiga, falou para mim que apesar da Prefeitura não ter feito mais que sua obrigação ao cuidar das vítimas e suas famílias a fez com tanto desvelo e atenção que a emocionou. Não agiu como sendo apenas uma obrigação, mas sentido dor pelo acontecido. Ela, poeta e cronista, falando sobre a tragédia escreveu ontem em sua coluna num dos jornais local palavras que encachoeiraram meus olhos (sou mineiro, portando meus olhos não marejam, eles se encachoeiram ou enlagoam), penso em um ex-aluno de teatro, que continua a seguir a carreira artística e que elogiou meu severo método pedagógico. “Nenhum outro professor de teatro que tive me ensinou o que aprendi com você”. Vaidades à parte, fiquei contente, claro. Pensei tudo isso enquanto escutava uma voz de mulher cantando alto “Meu coração é só de Jesus. Ei, psiu. Beijo me liga eu to curtindo a noite. Te encontro na saída! Minha alegria é a Santa Cruz. Volta logo pra São Paulo ou eu vou pra Madri”. Volto para casa, termino o texto e continuo o dia.

sábado, 9 de outubro de 2010

QUANDO ESCREVO PRA VOCÊ É COMO SE ESCREVESSE PRA MIM MESMO*

06 a 09 de outubro de 2010

Ofereço como presente de aniversário a

Shirley Maclane e Hércules Malta.


Pela retina.

Uma madrugada quente. Depois passeio com os cachorros. Ida ao Centro Cultural Usiminas para Oficina Ator Criador e descubro que não era as 09 e sim as 19 horas. Devolução de livros na biblioteca. Volta para casa. Um filhote de sabiá aprende a voar na rua deixando uma mulher preocupada “e se um carro passar nele”. Um homem tenta pegá-lo para jogá-lo no telhado sob o protesto nervoso e impotente dos pais do sabiazinho. Pega-o e o tira do perigo. Alívio na mulher, no homem, nos transeuntes. Eu sourrio. Em casa. Almoço. Escrever e mexer textos. Cochilar. Escrever projeto. Lanche. Banho. Ida à outra biblioteca devolver e pegar livro. Ir à Oficina Ator Criador. Autoapresentações. Eu sou Cláudio, da Cia. Luna Lunera e o processo que vamos experimentar na oficina usamos para criar “Aqueles Dois”... Respirando. Locomover pelo espaço. Olhando nos olhos. Ir para o chão. Pular. Andar. Mais rápido. Massagem. Tocar o outro e se deixar tocar. Deitar e ser rolado pelo chão. Rolar pelo chão vendo a resistência do par. Rolamento na vertical tendo o parceiro como suporte/base um do outro. Mais rolamento e mais. Maxuel é meu companheiro. Eu dele. Descoberta sobre os limites e entrega do outro. autoabertura para o jogo e para o parceiro. Tocar o outro e se deixar tocar. Ouvindo, ou tentando, o oficineiro. Respirando. A grande experiência de todos: entregar e receber. Diálogo. Acaba. Volto para casa. Banho. Dormir. Acordar na madrugada. Rezar. Ler à luz de velas. Apagar velas. Encantar com a beleza da fumaça. Observar que a brasa no pavio desaparece de baixo para cima. Seu último ponto vermelho é a ponta. Ir ao banheiro. Sair com cachorros. Tomar café com leite. Comer pão. Ler. Escrever. Ler. Sair. Voltar. Ler. Almoçar. Escrever. Ler. Continuar a escrever Projeto para Lei Estadual. Oficina. Alongar. Andar pelo espaço. Olho no olho. Seguir alguém. Seguir dois alguéns. Pegar alguém pelo olhar. Formar dupla com ele. Meu par Wadson. Eu dele. Massagem em pé, mantendo sempre bastante toque. Tocar. Cansaço. Tocar de todas as formas. Tocar em quase todos os lugares tocáveis. Reciprocidade. Separar. Nunca perder. Voltar. Aniversário de Felipe (Marcos é só para a mãe). Receber certificado. Ir embora. Dormir. Acordar na madrugada. Sair com os cachorros. Ver, hoje, uma mulher da madrugada andando leeeentamente, cansada, escorar-se no muro, respirar, abaixar, contar um, subir, respirar, abaixar, contar dois, subir, pegando algo, abaixar, contar três, subir. Nisso já virei a esquina. Volto, tomo café. E a vida continua.

Impura rotina.


CIDADE POSSÍVEL

A Banca Design promoveu na 6ª feira, dia 08 de outubro de 2010 o Recital Cidade Possível. O editorial do opúsculo, de Carla Paoliello e Bruna Roque, diz assim:

Cinco escritores foram convidados para escrever sobre uma cidade possível, resultado do viver e do sonhar em Ipatinga/Minas Gerais. Seus textos, histórias e fábulas estão nesta pequena revista. Apresentamos o passado, o presente e o futuro, conectamos o real e o irreal, para reordenar a vida. Boa leitura!

Foi oferecido aos presentes jabuticabas, bolo de banana, um chá de cogumelo... digo, de laranja. Uarrarrá! Brincadeira. Era um delicioso e, para mim, novidade chá de laranja. Foi oferecido muito carinho e atenção. O público presente era composto, entre jovens e adultos, por artistas, agentes culturais, estudantes, professores e nem sei mais o quê. Pessoas que acreditam numa Ipatinga possível e acessível. Se não hoje, ainda assim possível e acessível. Pensei durante o recital, mas não falei, portanto digo agora a frase de Tiradentes que nunca me sai da cabeça “Se todos quiséssemos poderíamos fazer desse país uma grande nação”.

Vejamos um pouco do que escreveram os escritores:

Nivaldo Resende – “Hoje, mais do que enorme orgulho

que, como tanto outros, eu carrego de ter ajudado a construir esta história, sempre sinto uma enorme satisfação em sair de Ipatinga para viajar. Não porque adore viajar, e eu adoro... não porque busque novidades, ou queira novos ares, mas unicamente para ter o inenarrável prazer de poder voltar para Ipatinga”.

NOS BRAÇOS DE MORPHEUS

Nena de Castro – “Diz que me ama e eu te faço um verso,

te dou um limão de cheiro, um canto de sabiá, uma canção formosa, um dedo de prosa... \ Pois no seu seio me aqueço e me encontro, raio de sol, rima incontida, eu te amo, cidade querida! \ Feliz aniversário, Pouso de Água Limpa, amada Ipatinga de todos nós!”.

RECADO DE AMOR PRA UMA CIDADE

Nena também escreveu e se encontra no livreto:

MINHA CIDADE, NOSSA IPATINGA...

Roberto Sôlha – “Uma das principais diferenças entre a

vida no interior e nas grandes metrópoles é a sensação de conhecer as ruas e bairros mais a fundo. Essa sensação, claro, é mais perceptível a quem mora nas cidades pequenas, onde fica mais fácil delimitar seu tamanho. Ao mesmo tempo, uma cidade de médio porte de Ipatinga pode revelar lugares e caminhos nunca antes vistos ou imaginados por moradores que vivem aqui a décadas.

CONTRASTES, DESCOBERTAS E SINGULARIDADES

Rubem Leite “Olho para a mulher, pego os biscoitos,

levanto-me e vou embora para outro ponto de ônibus. À cada passo que aproxima do novo destino a afasta de meus ouvidos, aproxima-a de meu coração e a afasta de minha cabeça. Na 28 de Abril dois homens e um menininho. Um ao celular, o outro na porta do banco, o menininho com o pintinho de fora faz xixi andando para trás deixando uma linha tortuosa na calçada. O estranho no celular sorri, o pai ri, eu me animo e o menino nem aí. Vou para o ponto de ônibus, sento, espero, pego o ônibus”.

A PROCURADA=

>25 DE SETEMBRO

“Hoje acordei sorrindo. \ Hoje os passarinhos da manhã cantaram mais. Mais tempo, mais alegre e mais bonito. \ Hoje até os políticos, com suas propagandas volantes, nos violentaram menos. \ Hoje dormi sorrindo”.

Ricardo Alves – “O dia mal clareava e os programas de

entregavam o sábado. O cheiro de naftalina da manhã úmida trazia à cabeça uma sensação gostosa de gavetas limpas. E se confundia com o cheiro de café com leite que vinha da cozinha. Depois de fartos pedaços de bolo, rua. Afinal, sábado também era dia de feira”.

MEMÓRIAS DE NAFTALINA

Voltando à Banca Design. Carla conta que tem tempo que está tentando levar a banca para a praça. Seu objetivo não é a venda de seus produtos – e eu acredito – e sim tornar mais acessível a população o acesso e contato com diversas manifestações culturais. Mas a Secretaria Municipal de Planejamento tem barrado. Permitiria se fosse para chaveiro, engraxate, banca de revista (De minha parte, nada contra eles. Mas por que não para a cultura?). Poderia pensar em liberar se as costas da Banca Design ficassem para a praça e sua frente para a rua. Mas por quê se é justamente para interação entre a praça, as manifestações culturais e o pessoal na banca?

Nena, como contadora de estórias, iniciou o recital. Depois cada um leu seu texto. Na ordem acima. Cada qual com sua peculiaridade. Nivaldo, entre grave e humorado. Nena, com seus trejeitos de professora e contadora de estórias. Roberto com seu modo de jornalista. Eu, como ator. Ricardo, com as mãos. Foi tudo muito legal. Rico. Gosto de nossas diferenças. A poeta Magali recitou um de seus poemas. O professor Beto, nosso “mediador”, mostrando as ligações entre nossas estórias e os fatos de nossa história. Eu, como contador de estórias, encerrei o recital. E depois conversando fomos nos dispersando com gosto de quero mais.


Banca Design – Av. Castelo Branco, 433 – Horto – Ipatinga MG.

www.bandadesign.com


* Caio Fernando Abreu

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

RECOMENDO - quadros de Tiago Costa

Olá Pessoal, td bem?
Já faz um tempo que não apresento novas produções aqui no Blog, atualmente estou fazendo um curso de Animação Clássica (Fantastique) na Melies -Escola de Cinema, 3D e Animação e está bem corrido, mas quero dizer que a produção está em alta.
As obras acima fazem parte de uma série de quadros que estou produzindo chamada:"Pássaros".

se vc tem interesse em adquirir uma dessas obras, envie um e-mail para:
ilustraeprop@hotmail.com

Neste e-mail poderei dar mais informações sobre, valores, dimensões, técnica etc.

Obs: Foi feita apenas uma peça exclusiva de cada obra, por isso corra e adquira já a sua.


Muito Obrigado.


Grande Abraço a Todos.


Até Breve.



Tiago Costa

FLORES NO JARDIM – A GRANDE HARMONIA

05:00h do sábado de 11 de setembro de 2010 a

05:23h de 5ª feira de 27 de setembro de 2010.


Na parte final do período de criação ouvi em duas versões

Adágio para Cordas em Sol Menor, de Albinoni.


Ofereço como presente de aniversário

a Keli Del Pozzo, ao músico Luis Tolonei e ao Rodrigo Quintino.


Reconcilia-te com todas as coisas do céu e da terra. Quando todo o Universo se tornar teu amigo, coisa alguma do Universo poderá causar-te dano. Reconciliar-se com todas as coisas do Universo significa agradecer a todas as coisas do Universo. A reconciliação verdadeira será consolidada quando houver recíproco agradecer. Se queres chamar-Me, reconcilia-te com todas as coisas do céu e da terra e chama por Mim. Porque sou Amor, ao te reconciliares com todas as coisas do céu e da terra, aí, então, Me revelarei. Reflexiona e reconcilia-te”.

(Trechos da Revelação Divina da Grande Harmonia – Seicho-No-Ie)


O Sol ainda nem surgiu, claro. Como vemos acima estamos entre cinco e cinco e meia. Mas o dia promete. Todo dia 25 de setembro é sempre, no mínimo, bonito. Acho que é um presente que recebo dos Céus... Penso que Keli concorda comigo e que Luís e Rodrigo acreditam que seja dia 30 de setembro ou 1º de outubro. Quem sabe?

Sentado ou talvez mais corretamente dizendo escorado num muro um vulto no escuro da madrugada que se prepara para ir embora. Sobre sua cabeça a palavra “maciço”, a sua frente uma pequena e mirrada árvore, dessas que mesmo adultas têm o tronco quebradiço, florzinhas branco-arroxeadas, com três galhos que surgem quase na raiz, logo acima do solo. O que será ele? Talvez um exemplar masculino ou então um exemplar feminino. Não dá para saber. Talvez nem seja uma pessoa exemplar. Ou sim. Olho meio disfarçadamente, para não constranger, por quase um minuto, pensando se daria alguma estória... Então prossigo em meu passeio matinal com meus cachorrinhos como volta e mexe falo aqui no aRTISTA e aRTEIRO.

Então um rapaz desconhecido e que não tinha visto até agora me diz “Bom dia, irmão”!

- Ah! Bom dia! – Respondo sorrindo.

- Como está passando?

- Bem! Obrigado! E você, como vai?

- Não posso dizer que estou saltando foguetes – pausa. Enquanto isso penso “Ainda bem! Foguetes fazem muito barulho. São muito chatos e incomodam todo mundo” e ele continua – mas também não tenho motivos para nenhuma cerimônia fúnebre.

- Ainda bem, né.

- Pois é. – Pausa – Vão-se os dedos, mas ficam os anéis.

Começo a dizer, em voz baixa, meio indeciso se devo calar ou falar “Não seria o contrário?”, mas ele talvez ouvindo, mas acho que não, continua

- Quero dizer, vão-se os anéis...

A conversa não é desinteressante, principalmente porque gosto de situações assim, que dão estórias curiosas, mas estou meio querendo ficar a sós com meus pensamentos e com meus cachorros. Chegamos ao entroncamento que me permite ir para minha casa

- ... mas ficam-se os dedos. – Diz aumentando a voz enquanto nos afastamos.

De volta vejo a mesma figura do início de nossa conversa, aquela no segundo parágrafo, no mesmo lugar fazendo a mesma coisa (o mesmo nada de antes) e sobre a sua cabeça a palavra “maciço” e à sua frente a arvorezinha que promete flores branco-arroxeadas.. Dobro a esquina e vou para casa.

Nos últimos momentos do escuro da madrugada alimento o corpo e com os primeiros raios do sol alimento a alma. Então com a manhã saio e ainda com ela volto. Minha mãe me diz

- Alguém telefonou para você. Pela voz era mulher. Acho que jovem.

- Quem era? Deixou recado?

Segundo minha mãe, não se identificou. Foi assim:

- Oi! O Rubem está?

- Não! Ele não se encontra no momento.

- Você poderia dar um recado?

- Sim, claro! Você é quem?

- Ah! Não precisa dizer meu nome não. Só queria dizer que acho as roupas dele feias e que não gosto do jeito que se veste.

- Ah! Obrigada! Então vou desligar. Com licença, adeus.

Depois da cena engraçada acima coisas mais alegres me aconteceram. Mas antes, permita-me esclarecer uma coisa. Alguns perguntam quando peço para não divulgarem meu aniversário se não gosto ser parabenizado. Mas é claro que gosto, só que acho que, exceções à parte, quem se importa se lembra e forçar os demais a me dar o parabéns é constrangedor ou no mínimo inconveniente. Eu gosto que lembrem, parabenizem-me, dêem presentes (Uarrarrá!) ou cartões e, muito importante para mim, orem por minha bem-aventurança. Mas partamos para exemplos de coisas felizes: Eddy e eu, sob a noite de meu aniversário, comemos queijo e tomamos uma garrafa de “suco de uva” de R$22,00 sobre o laguinho no Pq. Ipanema; no dia seguinte eu e minha família saboreamos bacalhoada e salada de frutas em minha casa; Selma Barros deu-me presentes e, o que mais gosto, um cartão; outros me deram presentes; muitos se lembraram e me parabenizaram; Nena de Castro comentou sobre meu aniversário no rodapé de sua coluna semanal no jornal Diário do Aço e me disse num desses dias que acontece o nosso bate-papo algo que transformo em versos e ofereço a todos os aniversariantes.

No meu jardim íntimo

Belo espaço você mora

Bem ensolarado

Entr’escumilha florida

E o grã limoeiro

Basto, florido e frutido

A gente conversa

E lê enquanto a Cam corre.

Flores no jardim.


Para quem não sabe, Cam é o nome da minha cadelinha

que retornou ao mundo espiritual alguns meses atrás.

Mas comigo continuam Haicai, Decidido e Vitório.

São muitas alegrias. Deus, muitíssimo obrigado!

sábado, 18 de setembro de 2010

TUM ... TUM

18 de setembro de 2010.

Ofereço como presente de aniversário aos queridos

Marisa Alija, Maraiana Sanches, Clênio Magalhães e Antônio Ademir da Silva.


Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum. – Tum.

Estávamos, minha mãe e eu, no estacionamento do hipermercado e enquanto falávamos e escutava a espaços regulares o som “tum” que foi se ampliando de volume ou melhor, foi se aproximando. A compra já foi feita e agora só no próximo mês. Na automática curiosidade olhei e vi um homem batendo com uma lata na cabeça de um menino de uns treze anos enquanto iam embora. O garoto não reagia. Simplesmente andava de cabeça erguida, o que, a meu ver, facilitava o ataque. E o homem, mais ou menos da minha idade, quarenta e dois, nada falava. Só batia.

Vi os dois se aproximando. Vimos os dois passando por nós. Vimos os dois se afastando e sempre com o “tum ... tum”. Eu imóvel olho a cena. Boquiabertos os vemos se afastar. Para que se envolver? Quantas vezes já vi na fila do caixa rápido um e outro abrir um bombom e o comer deixando o papel na prateleira. Ou tomar um iogurte enquanto faz a compra e deixar a embalagem numa gôndola qualquer. Afinal por que não fazer? Para que se envolver? Somos uma nação cristã.

Mas eu não sou cristão. Tenho muito amor a Cristo para ser um.

- Ei! Ei!

E os dois andam com o “tum”.

- Ei homem!

Eles finalmente param. O homem olha para mim. O garoto só olha para frente.

- O que você quer?

- Para com isso.

- Cuida da sua vida.

- Cuido mesmo. Pode parar agora, por favor.

- Ah! Vai te catar. – E voltam a andar.

- POLÍCIA. POLÍCIA. POLÍCIA. POLÍCIA. POLÍCIA. POLÍCIA.

E o garoto só olha para frente.

Finalmente a polícia chega. Se inteira da confusão. Cuida dos dois e volto para casa trêmulo de nervoso. Ambos, minha mãe e eu, assustados.

Compra do mês seguinte.

Após a compra paramos na lanchonete elegante do hipermercado. Sentados tomamos um refrigerante e comemos algo.

- Com licença!

Olhamos. É o homem. Começo a me sentir nervoso. Raiva e acuado.

- Escutei o nome da senhora. – Fala para minha mãe e continua – E me lembrei dos dois. – Olho desconfortável. Parte por receio e parte maior pelo atrevimento do sujeito. Ele conclui – Quando era adolescente meu pai me batia muito e nos deixava com fome por um ou dois dias. Uma tarde, após três dias sem comer a senhora me deu comida. Nunca comi tanto quanto naquele dia. Nunca me senti tão grato quanto naquele dia. Por isso fiquei calado... e não vou fazer nada. Adeus.

Diz e se afasta. E eu não soube o que dizer, nem sequer falar. Então me calo.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

ENARTCI – EMERGÊNCIA

AS PARTES DO TODO e CONVERSA PÚBLICA

Texto Rubem Leite

Imagem arquivo Híbridus.

ENARTCi 2010 aconteceu entre os dias 04 a 07 de setembro.

8º encontro de dança contemporânea de Ipatinga MG.

Dança + performance + conversa.

Promovido pelo Híbridus Dança.

Ofereço como presente aos aniversariantes Bruno Faccini, Cláudio Miranda, Wenderson Godoi.


Troco meus cabelos por pão.

Cabeça mal raspada gemendo na areia seca ao som de águas que não chegam

Promessas

Promessas não cumpridas

Um corpo solitário se move em círculos na ilha de areia

Areia seca

Penas compridas

E os corpos incontáveis amontoados dentro de um só corpo

Prisão

Prisão de vários

A prisão, a falta de liberdade é uma loucura

A luz circunda, mas é fora,

Alumia, mas não é própria

Não pertence

E mesmo essa luz esvanece

E se vai

Deixando todos os corpos imóveis em um.

A artista da dança Patrícia Cruz, de Recife PE, criou com Daniela Santos (RJ\RJ) um trabalho solo representando as emoções sentidas na Casa da Cultura, que já foi Casa de Detenção. Daniel Silva trabalhou como músico e Black Escobar dirigiu. Patrícia e Daniela não procuraram explicar ou mostrar os acontecidos e sim as “sensações”. Então acima minhas sensações e emoções durante o espetáculo “As Partes do Todo”.

Já na conversa

O espaço público é de todos, mas não é privado. Portanto, uma vez que invadimos um lugar que já é normalmente ocupado e os artistas quase dizem, ou melhor, quase gritam “Ei! Olhe-nos aqui!” surge a pergunta: um trabalho na rua é autoritário? Alguém tem a resposta para tal indagação? Não precisa ser uma resposta definitiva. Pode ser a sua resposta. A que você tem hoje. Meu email, para quem quiser compartilhar comigo a resposta, se encontra logo abaixo.

O Híbridus publicou também o “II Caderno ENARTCi – Emergência”. Uma publicação luxuosa, instrutiva e, melhor, saborosa de se ler. Com textos de diversos artistas e agente culturais. O referido caderno é fruto do ENARTCi do ano passado e foi organizado por Cláudio Letro e Wenderson Godoi. Um dos muitos trechos que me encantaram foi “... a construção de novos saberes por intermédio das artes, especialmente as do corpo”. Deixo para você, que me lê, a interpretação da fala do Godoi e se não for pedir muito que, por gentileza, compartilhe comigo a sua análise ou o seu entendimento.

O meu email é arterubemleite@gmail.com


segunda-feira, 30 de agosto de 2010

PESSOAS ou COISAS podem MUDAR o mundo... mas HOJE nada ACONTECEU

Rubem Leite.

21 a 30 de agosto de 2010.

Ofereço a Cia. Dos Aflitos e a Bruta Cia. Teatro. Querendo saber mais sobre eles vejam os email’s ciadosaflitos@gmail.com e ciabruta@hotmail.com

E ofereço como presente de aniversário a

Luan P. Pereira, Matisael Lima, Cleverton Nunes, Adriano Brittes, Didi Peres, DJ Gabriel 22.


É o Centro de Ipatinga, cidade do interior de Minas. Por quase vinte anos recebeu reconhecimento nacional como município mais arborizado do Brasil. Quatro anos atrás teve quase metade de suas árvores cortadas e as pontes, viadutos, faixas de pedestres e outros pintados de verde. De dois anos para cá a cidade está sempre empoeirada, suja, feia. De um ano para cá, quando o dia está calmo, na João Valentim Pascoal, da Prefeitura ao Banco do Brasil, somos abordados por um pedinte. Nos outros dias até por cinco já me pediram dinheiro numa tarde. Na falta me pediram pão. Na falta me pediram cerveja. Na falta me pediram cochinha. Na falta me pediram dinheiro outra vez. Mas não é sobre isso que vamos conversar.

- Acorda Ismael!

Ismael surge na porta, já acordado e arrumado às cinco da manhã.

- Bom dia, Manuel!

- Bom dia! Taqui o dinheiro.

- A mesma quantidade de pãos?

- A mesma!

Ismael de dentro do barraco monocômodo tira a bicicleta. Pega aqui, pega ali, empurra, volta, encosta na parede, muda de lugar, pega aqui, pega ali, muda de posição, empurra, encosta, volta, empurra, tira do barraco, segura a bicicleta, sai do barraco, monta e se vai. Domingo, segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado, domingo, segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado, domingo. Dia V 2010 vou ao Parque Ipanema trabalhar na barraca do GASP – Grupo de Apoio aos SoroPositivos –. Pouco fiz, é verdade. Muita gente no estande. E também um pouco de vontade de ficar a toa. Sai para admirar a paisagem. Um garoto me chama a atenção. Por quê? Nada especial nele. Nada fez além de estar sentado. Deu-me vontade de fazer amizade. Mas acho que não vale a pena (O cara é cruzeirense. Uarrarrá!). Brincadeira. O que carinha parece legal. Aproximo e começo a conversar. O garoto se espanta e pergunta “É comigo que você está falando”? Entenda! Não foi rude. Apenas não me viu e está desacostumado com estranhos o procurarem. Tiago é arredio, desconfiado. Acho que o que me atraiu nele foi a vontade de se aventurar. Aprender a se virar. Pense. Ele tem dezesseis anos e, acho, sempre foi dependente da família. Agora, talvez pela idade está querendo se lançar em seus primeiros vôos. E vôos cegos assustam até a mim que não sou enxergo. Pensei que ele era mais velho. Uns vinte e poucos. E como todo adolescente crê que sabe tudo. Os adultos é que estão congelados. Mas adolescente não sabe o que é ser adulto. Não tem como saber. Pior é o adulto que esquece o que é ser adolescente. Mas eu tenho uma vaga suspeita que já tive essa idade. Não tenho certeza. Uarrarrá! Portanto consigo ter um vislumbre do que é ter certezas sem base nem experiências. E tolerar. Penso que sei o que me atraiu no garoto. Ele escreve. E bem, parece. Recitou-me alguns de seus poemas. Um achei banal. Outro foi bom ouvir e o do meio foi o melhor. Minha alma sensível deve ter sentido a alma artística do Tiago. Mas também não é sobre isso que quero lhe falar.

À tarde fui ao FeirArte me encontrar com meu amigo Eddy, mais conhecido por Didi Peres. Mas isso não é correto. Ele é Eddy e pronto. Quem eu encontrei foi Luís Yuner. Um grande palhaço. Hum! Não! Ele é baixinho. E muito bom palhaço. Geralmente não gosto de palhaços, mas ele tem uma apresentação que me dá vontade de ser um só para fazer aquela, como eles dizem mesmo? Reprise! É assim que no circo é chamado uma apresentação, sua ou de outro, já pronta. Ficamos conversando por horas até Eddy chegar. Um momento Luís vai ao banheiro e surge uma mendiga dizendo “Vou tomar essa cerveja”. Não permito. A cerveja nem é minha. Ela larga a lata e pega o copo plástico com vinho e já vai levando a boca. Diante de meu olhar surpreso o dono da barraca manda a mulher sair. Luís volta. Eddy chega. Outro mendigo aparece querendo que a gente compre espetinho de camarão para ele. Eddy comenta que eles mudaram os modos. Quase impõe. Um momento a sós escrevo “Os olhos sobem para dentro das pálpebras \ E sua desconfiança não se esconde \ Mas muda de feição \ Não sorri”. Não concluo a estrofe deixando-a sem nenhuma rima. E ainda não é sobre isso que quero falar.

Perguntaram num espetáculo, o que deu nome à nossa conversa, o que é o tempo? Das possibilidades que me apresentaram a mais eloqüente, acho, é “Tique, taque, tique, taque” dito pelo relógio. Mas minha grande pergunta sobre a pergunta deles é “E se o passado voltar?” que ouvi no espetáculo. A cia. dos Aflitos fala para nós no espetáculo e durante um bate-papo após o referido que às vezes as coisas mudam, as não deveriam. Eles falam quem são eles. Fiquei contente deles saberem e quis perguntar se podem me dizer quem sou. Mas achei que seria abusar. Até porque o pessoal deixou umas entrelinhas quando se descreveu subjetivamente. Mas eles sabem que querem o que não sabem o que é. Eu fiz um haicai para eles. E só sei que comecei com. Ah! Esqueci também.

Na verdade o que quero dizer é nada disso. Apenas estou com vontade de falar. Ouvir também. Quem quiser deixe um comentário que vou gostar. Ou então mande uma email.

Ah, Sammer! Segundo você me disse, acho que vai te ajudar em seus exercícios os seguintes textos meus aqui no aRTISTA e aRTEIRO:

  • A Criança Feia;
  • Cobra rainha;
  • Dentes;
  • O Grande Dia;
  • Onipotência;
  • Pensem onomatopéia;
  • Meu pai, o gato e as vespas.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

haicai eu

FOLHAS MUITO GROSSAS
UM TRONCO REAPROVEITADO
PEITO BROTA PÁSSARO

sábado, 21 de agosto de 2010

MEU PAI, O GATO E AS VESPAS

Escrita às sete horas da manhã e mexida às 15 horas

do dia 21 de agosto de 2010.

Ofereço como presente de aniversário a

Graciele Morgan, Luana Rodrigues, Michel Ferrabbiamo.


Meu pai morreu. Todos sabem disso. Fomos ao velório e o enterramos a quase 19 anos atrás. Então como minha mãe, meus irmãos e nossos conhecidos não estranham ele está conosco? Como as pessoas agem como se ele estivesse com a gente esse tempo todo? Dizem que um louco não admite a hipótese de estar louco. Será que estou? Um louco manso... Que aceita tal idéia? E as outras coisas? O gato que me odeia. Me ataca quando passo por ele. Procura-me e me persegue. Numa inteligência humana. Uns olhos vermelhos. Uns miados roucos, de garganta não usada e dentro de uma caixa... São assim os miados. São assim. E as vespas? Colméia... Vespa faz colméia ou é outro nome? Bem! Os ninhos marrons avermelhados, disformes como se fosse obra cubista, fora de casa logo acima da janela da sala e quase do meu tamanho. Ferrão duas vezes maior que elas. Por que ninguém estranha?

Falei do papai e olharam-me como se eu dissesse bobagem. Quando falo, eles nem me ouvem. Viram a cara para o outro lado e continuam o que faziam. Qualquer outra coisa que não seja papai, o gato e as vespas eles me respondem, conversam comigo.

Será que estou louco? Mas então porque eles agem como se eu fosse normal quando falo de outros assuntos? Será assim que agimos com os doidos quando falam o que consideramos certos?

Estou no quarto. Porta trancada, janela fechada e o sol entrando por ela enquanto escrevo “a quem possa interessar”. Uma vespa, duas, na janela. O gato na gameleira. Cinco, sete, dez vespas na janela. O gato mia no galho da gameleira. Quase metade da janela com vespas. Seus ferrões no vidro. Quíqui. Quíqui. Quíqui. O quarto escurecendo. O gato mia no galho quase encostado à minha janela com mais da metade coberta de vespas. Quíqui. Quíqui. Quíqui. Acendo a lâmpada. O gato olha para mim nos poucos centímetros ainda não cobertos do vidro. Quíqui. Quíqui. Miado. Quíqui. Tásqui. A luz se apaga. Paro de escrever. Não agüento. Não tenho como. Miado. Quíqui. Tásqui. Outro rachado no vidro. Batida na porta. “Filho”! Miado. O vidro se quebra. Papai arromba a porta.

Agora são só meus pensamentos gravados na parede do quarto. Só meu pavor no ar da casa. Ninguém se lembra de mim.

Foi loucura ou aconteceu?

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

NO ÔNIBUS

Madrugada de 09 de agosto, mês do bom gosto.

Ofereço como presente de aniversário à minha querida sobrinha

Priscila Pacheco Leite.


Fui a pé para Coronel Fabriciano, a cidade vizinha. É longe, muito longe para ir sem transporte. Quando eu era mais novo dava conta numa boa, mas, agora, aos quarenta e dois é um pouco mais difícil, mas conseguirei. O que fui fazer lá? Ah! Isso é da minha conta. Não se chateie, por favor, mas é questão pessoal que não entra nessa estória. Noventa minutos andando e cheguei ao Horto, mais meia hora e estou quase na divisa, só mais umas meia hora, e depois mais umas duas ou três horas, talvez quatro, e chegaria na parte urbana que me interessa. Estava cansado. E como dizia, estava no bairro Horto quando vi minha mãe dirigindo um fusquinha. Com tanta coisa para dirigir ela foi pegar logo um fusquinha? E ela nem sabe dirigir. Mas ela apareceu e me levou para Fabriciano. Deixa-me na Praça da Estação. Lá tem uma estátua, parece-me, imitação melhorada da Estátua da Liberdade. Não sei, é o que me parece. Só que diferente e mais bonita. Ou será Themis? Não, Themis fica na entrada do Fórum, em Ipatinga. Não importa. Mamãe desapareceu e fiz o que tinha que fazer e voltei de ônibus.

No ônibus sento-me atrás do motorista e conversamos. Ele deve ter mais de cinqüenta anos, é levemente gordo, bigodudo e é meia careca. Enquanto conversamos deu-me má resposta quando perguntei algo que nem me lembro mais. Ele está estressado. Relevei. Continuamos a conversar. Os passageiros, mais de dez, menos de vinte. Falam sobre futebol. Falam mentiras do Atlético e verdades do Cruzeiro. Gaaaaalooo. Tem até um coelho e dois tigrenses. Mas o Atlético leva a melhor, claro, pelo menos no falatório. Uarrarrá. Continuo a conversar com o motorista. Tiro uma folha de couve da sacola que levo e como. Folha estranha, mastigo e mastigo e não consigo engolir. Incomodado, cuspo-a pela janela. O vento esquisito faz com que um pouco dos pedaços voe até ao motorista. Irritado pega um punhadinho e me joga na cara e ri debochado. É! O cara não está errado, mas não sei se ele está certo. Olho espantado para o sujeito por um segundo e por cinco segundos. Dez segundos, levanto-me e vou para trás em silêncio. Não sei se ele está certo, mas não dá para dizer se está errado. Agora! O riso de deboche! Esse eu sei que está errado. Penso em discutir com o distinto cavalheiro. Decido ser feliz. Mais do que está certo, ter razão, prefiro ser feliz. E, como diz Nena de Castro, “Nada mais digo”.

sábado, 7 de agosto de 2010

ONIPOTÊNCIA

Estória aparecida na madrugada de 07 de agosto de 2010.

E ofereço como singelo, porém carinhoso, presente de aniversário a

Cristiano Milagres e Thiago Moreira.


Dia e noite era uma barulhada na casa. Sete crianças... “Crianças? Eram uns capetas, isso sim”. Pensava tio Ivo. Entre cinco e dezesseis anos. Só havia silêncio nas madrugadas. Ter de trabalhar duro na fábrica e ainda cuidar daquilo que não era seu o esgotava. Só ficava com as crianças porque o CMDCA o obrigava, pensava.

Mas quem é Ivo? Ele é tio Ivo, para as crianças. Doutor Ivo para os empregados da casa e da fábrica. Ivo para os clientes e amigos, se os tivesse. Amo para Syn.

Uma noite especialmente difícil. Pela manhã, as crianças e depois empregados reclamando do salário. Pela tarde, cliente reclamando. E agora, crianças brigando, o jantar demorando e Maysa não viria. Sua namorada e cantora de voz quase tão boa quanto a original.

- Syn!

Quem é Syn? Como aquilo é? Ele... Não, não é ele, nem ela. É... É Syn.

- Deseje, meu amo. Qual é sua vontade?

- Cuide das crianças. Ensine bons modos.

- Cuidarei, amo. Em um mês o senhor verá os resultados.

Nada mais disseram. Apesar de um mês ser ainda muito para se ter paz, Ivo aceitou. As crianças algazarrearam ainda por umas quase duas horas e foram dormir. A primeira foi Ana, a mais barulhenta. A segunda foi Clara, a mais inconveniente. Depois foi Pedro, o mais levado. Em quarto foi Paulo, o mais brigão. O quinto foi José, o “come quieto”. Logo após foi João, o mais lambão. E por fim, Luzia, a mais antipática. Pelo visto, ter nome de santo nada dizia.

No dia seguinte custaram a acordar. Estavam cansadas pelo dia de ontem e Ivo tomou café sossegado. Na empresa trabalhou sossegado, os empregados reclamaram, mas foi fácil controlar a turba. A tarde recebeu boas notícias no campo empresarial. Voltando para casa, entrando no jardim, reparou que ninguém ligara reclamando das crianças. As crianças. Ana, Clara e Luzia na sala assistindo televisão.

- Boa noite, tio Ivo. – Disseram meio apáticas.

- Boa noite. – Disse sorrindo. – Cadê os garotos?

- Estão nos quartos. – Quem respondeu foi Ana e Clara completou

- Depois do almoço foram dormir e estão lá até agora jogando ou vendo tv.

- Então tá.

Durante o jantar comeram os nove. Ivo, Maysa e as crianças. E Ivo conseguiu conversar. Estavam quietos. Depois assistiram um dvd. Durante o filme, as crianças foram deitar e uma a uma dormiram. Ivo e Maysa foram deitar, não dormir. Pela manhã o café foi agradável. Ivo foi para a fábrica. Maysa foi ensaiar. E as crianças quieta.

Assim aconteceu por mais cinco dias. Depois por mais uma semana cada vez mais sossegada. Aos quinze dias perceberam algo errado. Ou melhor, Dr. Ivo captou a anormalidade da coisa. As crianças não se levantaram. Telefonaram para o patrão.

- É só uma gripinha.

À noite continuavam deitadas. Com febre e pouco falavam. No dia seguinte não teve jeito. Tiveram que chamar um médico. Exames. Exames. Exames. Exames. E nada de descobrirem o que seja. Parecia banzo. Mas banzo? Eles não tinham motivos para tristeza. E os sete, ao mesmo tempo, com depressão profunda? Mas seria mesmo banzo? Depressão! Como chutaram os médicos?

- O quadro nos assusta, Dr. Ivo. Não entendemos o que eles têm. Parece ser depressão associada a outras patologias. – Estão falando em linguagem para leigos devido ao “pedido” irritado do Dr. Ivo –. Mas não conseguimos saber o que realmente está acontecendo.

E os exames continuaram. Depois mais exames. E por fim mais exames. E finalmente após três semanas, quase quatro, descobriram... Nada. Só aí Dr. Ivo pergunta:

- Syn! Você é o responsável por isso?

- Sou!

- O que fez? Por que fez?

- É o seu desejo. – Responde a segunda pergunta e vai para a primeira – Estou fazendo com que morram.

- Não pedi para os matar.

- Pediu sim. Disse para cuidar deles. Estou cuidando.

- Cuidar. Falei para cuidar. Não pedi para matar.

- Seu pedido foi para cuidar. Seu desejo era se livrar deles. Sua vontade é que eles morressem.

- Não pedi...

- Mas desejou. Atendo não seus pedidos, mas sua vontade.

- Não quero que eles morram. Quero que eles sejam comportados.

- Seu desejo é que eles sejam quietos. Sua vontade é não tê-los.

A conversa se arrastou em silêncio por longo tempo e ficou apenas nisso. Huuum! Não, na verdade não. Ela se encerrou com as seguintes palavras de Syn

- Atendo sua vontade, não suas palavras. Quer que mude o que está acontecendo troque o desejo.

Dr. Ivo, na capela do hospital, pensa e pensa. Mas razão não move o mundo, nem muda os sentimentos. Bem! Talvez ajude. Ele acha um livro abandonado. Ou deixado por alguma alma generosa. Abre ao acaso e lê “Todos vivemos procurando a paz. Algumas pessoas buscam paz somente para si, mas devemos buscar a paz de toda a humanidade. Sem paz no mundo, não há paz individual, pois esta desaparece tal como o sereno. Devemos sempre ter amor imutável, pois é dele que advirá a paz verdadeira e imutável pela força da infalível lei da mente. Devemos abandonar o ‘amor interesseiro’ e a ‘oração interesseira’, ter ‘amor universal’, fazer diariamente ‘oração pela humanidade’ e agir conforme essa oração”¹. “Meus meninos! Que fazer? Como?”. Depois da reflexão seus sentimentos começam a mudar. Começam.

Passa o dia. O quadro se estagna.

Passa uma semana. O quadro começa a melhorar.

“Será a melhora que antecede a morte”? – Pensa. – “Torço para que não”.

Eu, pessoalmente, acredito que não.

Completa o mês. O quadro melhora.

Mas, você que me lê, deixo em suas mão o destino das crianças.


¹ Livro Minhas Orações – Professor Masaharu Taniguchi – Pela paz perpétua.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

par

Palmeiras esperam

Contradança com o vento

Eu aqui parado.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

ASAS PÚRPURAS – DE UM BEIJO ALÇANDO VÔO e SUCATA HUMANA: CAMPO DE REFUGIADOS

por Nena de Castro e Marilia Siqueira Lacerda

(Deixai toda esperança, oh vós que entrais!
Canto III - 9 – Inferno - A Divina Comédia, de Dante Alighieri)

Sob o canto do vento
e das folhas caídas
– qual asas púrpuras de
um beijo alçando vôo –
precipito lânguidos desejos
onde as palavras
são pássaros fugazes
que cativam e seduzem.

Faço planos por razões
fragmentadas e inconfessáveis
para o cair das manhãs...

(– nas reticências busco
o ponto inatingível do infinito).

Concedo-me escolhas

despida de ânsias e medos

(– qual céu azul mirando-se

no espelho das águas)

com o entusiasmo de alma
rica de poesia e sentimento.

Naquele terrível lugar, não há brisa que acaricia, só vento quente que traz a peste. Naquele lugar não voam nem cantam pássaros, a não ser os corvos imaginários que, em revoada, fazem sombra para a Morte. Naquele lugar, antessala do inferno, portal do Haden, jazem seres quase espectrais, envoltos em mantos esfarrapados e dor. Ali a luz do sol não é alento, e a noite multiplica os terrores. A sede devora, a pobreza devora, a desesperança mata. Ali não há risos de crianças, nem vozes de mães em canções, só desespero e dor. Amontoados como animais, doentes esquálidos esperam que o mundo “cristão” lhes mitigue a fome, lhes dê liberdade, resgatando-os para a vida! Nada, além de bravatas, nada além de reuniões de poderosos, onde muito se discute sem vontade de agir, nada, além dos versos doridos dos poetas que cantam a dor.